Com juro alto, lucro das empresas gaúchas na bolsa desacelera no primeiro semestre

Em um ambiente marcado por juro ainda em patamar elevado e acomodação da economia, as margens das empresas gaúchas de capital aberto desaceleraram no primeiro semestre de 2023. O lucro líquido de 23 das principais companhias do Estado com ações negociadas na B3 recuou 22% no acumulado dos primeiros seis meses do ano ante o mesmo período de 2022. Já a receita líquida retraiu cerca de 4% no mesmo período. Esse diagnóstico é praticamente espraiado entre os setores, mas é percebido com maio intensidade em negócios de ramos como indústria, construção e agropecuária. O destaque positivo ocorre no âmbito do setor de transporte coletivo. Investimentos travados por Selic elevada, inflação e comparação com uma base mais forte do ciclo anterior ajudam a explicar essa perda de ritmo, segundo especialistas.

No primeiro semestre, o lucro líquido dessas 23 companhias somou R$ 8,7 bilhões. No mesmo período do ano passado, essa cifra ficou em R$ 11,2 bilhões. Analistas observam que, mesmo com pé no freio, os números atuais ainda mantêm as margens em nível elevado.

Valter Bianchi Filho, sócio-diretor da Fundamenta Investimentos, afirma que a economia atuando em um ambiente com taxa de juro elevada é um dos principais fatores que explicam o desempenho menor das empresas gaúchas nessa primeira metade do ano. Esse componente prejudica diversos ramos, como indústria, construção e varejo, segundo o dirigente:

— A comparação de 2023 com 2022 está sendo mais cruel para as empresas gaúchas. A gente tem 2023 com um impacto de juro mais alto. O que é prejudicial para negócios ligados ao varejo, produção e infraestrutura.

Os dados dos balanços das empresas corroboram a análise de Bianchi Filho.  A Panatlântica, ligada ao ramo de aço, apresentou queda de 85,65% no lucro. Unicasa, do setor de móveis, Taurus e Kepler Weber, da área de indústria, e Quero-Quero e Grazziotin, ligadas ao varejo, estão entre os negócios com maiores quedas no lucro (veja no gráfico). A Gerdau, que ocupa boa parte dos números, também teve queda nas margens, encolhendo 25,98%.

Tanto na receita líquida, quanto no lucro líquido, o destaque positivo entre as empresas gaúchas de capital aberto é a Marcopolo. O faturamento da empresa avançou 43,02% no primeiro semestre ante o mesmo período de 2022. Já as margens do negócio cresceram 201,65% nesse mesmo recorte de tempo.

Os especialistas ouvidos pela reportagem apontam que a retomada do setor de transportes pode ter impacto nesse movimento da empresa com sede na Serra. A volta da circulação de pessoas por meio do transporte público e renovação de frotas de ônibus em municípios são alguns dos ingredientes que ajudam a formar esse cenário de recuperação acelerada.

Quais os setores que sofreram mais no primeiro semestre?

A redução do lucro foi praticamente disseminada entre as principais empresas gaúchas com ações negociadas na bolsa. Em linhas gerais, setores ligados à produção e indústria sofreram mais diante de um ambiente econômico com juro alto e resquícios do dano causado por estiagens recentes no Estado. Esses fatores seguram os investimentos e impactam os retornos das companhias.

Além disso, a comparação com bases mais fortes do ano passado diminuiu a variação do lucro em algumas empresas ligadas a commodities, como Gerdau, Randon e Kepler Weber. Ou seja, após recordes de margem no ano anterior, o lucro desses negócios começa a normalizar com esse efeito de comparação.

Negócios ligados ao varejo também foram penalizados por um ciclo de inflação que penaliza o consumo de bens. No agro, a comparação com anos de expansão provoca números menores. O juro alto no mercado externo também impediu avanço maior desses negócios ligados à produção de matérias-primas.

Quais ramos apresentaram os melhores resultados

Algumas empresas ligadas ao setor de transporte, como Marcopolo e Randon, apresentaram bons resultados diante da reativação do setor após um período de baixa na pandemia. A volta da circulação de pessoas de maneira mais consolidada impulsionou essa área.

Outros fatores que travam avanço maior das empresas

Especialistas afirmam que parte do recuo dos resultados em alguns ramos também ocorreu diante de algumas incertezas no início do novo governo federal, que ainda não sinalizou claramente para o mercado como será a organização das finanças públicas.

O que esperar daqui para frente

Especialistas estimam que o cenário deve ser parecido para os próximos meses, com empresas ainda sofrendo com o efeito do juro alto, que recém começou a recuar. Nas áreas ligadas a commodities, o movimento de acomodação deve seguir. No varejo, o comprometimento da renda dos consumidores, com endividamento alto, e competição de empresas internacionais segue pressionando esse segmento. Ambiente melhor é esperado para a segunda metade de 2024, quando o ciclo de retração da taxa de juro básico começará a causar mais efeitos no aquecimento da economia.

Base de comparação também afeta o movimento

José Eduardo Daronco, analista da Suno Research, afirma que empresas ligadas a commodities, como Gerdau, Randon e Kepler Weber, apresentaram números recordes em 2022 durante a retomada. Agora, os dados são comparados com uma base muito forte, o que impede uma variação positiva na comparação.

— É natural que, com a estabilização e queda dos preços das commodities e uma desaceleração global, os resultados caiam. E mesmo assim o patamar atual é muito acima do que a gente observou no passado.

No comércio varejista, o analista cita a competição de parte do setor com empresas internacionais e problemas de renda, com uma população muito endividada, como principais fatores que pressionam o setor. Isso afeta empresas como Renner, Grazziotin e Quero-Quero.

Para os próximos meses, Daronco projeta sequência do cenário observado no primeiro semestre:

— Nas empresas de commodities, o resultado deve ser em linha com o primeiro semestre. No varejo, deve ser um resultado pior mesmo com a queda de juro. O varejo tende a se recuperar a partir do ano que vem.

Valter Bianchi Filho também estima cenário parecido para os balanços das empresas no segundo semestre. O economista reforça que a queda do juro está apenas no início e terá efeito mais incisivo a partir da metade do próximo ano.

Fonte: GZH

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