NÚMERO DE CANDIDATAS A VICE-PREFEITA CRESCE NO RS

Das oito chapas que disputam a prefeitura de Porto Alegre, três são encabeçadas por mulheres e quatro têm mulheres na vice. Entre aquelas cujos partidos têm representação na Câmara dos Deputados, elas estão em todas: Maria do Rosário (PT) e Tamyres Filguera (PSol) integram uma chapa completamente feminina; Juliana Brizola (PDT) é a cabeça de chapa na coligação com Thiago Duarte (União Brasil); e, tanto Sebastião Melo (MDB), que tenta a reeleição, quanto Felipe Camozzato (Novo), escolheram mulheres para compor o seu time na disputa pelo Paço. Na chapa do emedebista, a escolhida foi Betina Worm (PL) e na do liberal, Raqueli Baumbach (Novo).
 
Ao total, sete mulheres compõem as chapas majoritárias nas eleições deste ano na Capital. Proporcionalmente, o número é 10% maior do que o de candidatas em 2020. À época, entre os 26 candidatos (prefeitos e vices), sete eram mulheres. Agora, são sete entre 16. O aumento de candidaturas femininas na Capital é emblemático, mas isolado.

Em todo o Rio Grande do Sul, o número de mulheres que disputam prefeituras sequer mudou em comparação com quatro anos atrás.

Em 2020, foram 126 candidatas e, este ano, são 127. O número de candidatas foi o único que cresceu, indo de 239 para 258, o aumento é sutil, de 7%, mas único entre os cargos. Nacionalmente, o número de vices mulheres também cresceu.

Para além das articulações políticas, a escolha de mulheres para a composição de chapas majoritárias, mais especificamente para a posição de vice, tem uma série de fatores que podem indicar mais do que um movimento espontâneo dos partidos políticos na busca de aumentar a representatividade feminina. Esses pontos vão desde a distribuição de recursos aos efeitos da polarização, avaliam especialistas.

Financiamento é ponto central

Desde 2018, os partidos são obrigados a destinar um valor proporcional ao número de candidatas de todo o financiamento público (isso inclui os valores do Fundo Eleitoral). A mesma regra vale para a distribuição do tempo de propaganda política em rádio e TV para candidaturas femininas. Acontece que a lei não determina ou restringe para quais candidaturas esses valores deverão ser direcionados, explica Teresa Sacchet, doutora em Ciência Política e professora do Departamento de Ciência Política da UFRGS.

Na prática, isso quer dizer que, se o partido optar por destinar todo o percentual necessário para uma única candidata a vice com o objetivo real de fortalecer a cabeça de chapa, usualmente liderada por um homem, ele pode. “É claro que (essa prática) vai gerar protesto dentro do partido. Isso é improvável de acontecer, mas pode acontecer se quiserem”, diz Teresa.

Em 2020, primeira eleição em que a norma começou a valer, o número de candidatas que disputaram o cargo na vice, só no RS, cresceu 24%. De lá pra cá, esse salto não foi tão expressivo. Ainda assim, não deixa de ser um indicativo quando nenhum outro percentual de participação feminina aumentou, como o número de candidatas a prefeitas e vereadoras.

“Obviamente há uma desvirtuação dessa política quando você coloca uma mulher na posição de vice para potencializar a candidatura do homem que está concorrendo na posição titular e isso também ocorre quando colocam mulheres na posição de suplente de senador, por exemplo”.

Siglas negam peso do financiamento na escolha

Lideranças partidárias responsáveis pelas escolhas das vices em Porto Alegre afirmam que a questão dos recursos sequer foi considerada. Segundo o Novo, inclusive, sequer foi lembrada. Coordenador da campanha de Felipe Camozzato, Frederico Consentino conta que recordou da regra quando entrou em contato com a direção nacional do partido para tratar de quando os valores seriam liberados.

“Não pesou porque não faz diferença”, explicou, argumentando que os recursos do Fundo Partidário do Novo são reduzidos se comparados com as outras candidaturas com representação na Câmara.

Além disso, Consentino afirma que a escolha de uma mulher para compor a chapa não se deu necessariamente pelo gênero, ainda que eles buscassem um perfil diferente ao de Camozzato. Sem alianças partidárias, Raqueli, filiada no partido desde sua criação na Capital, surgiu como opção pela sua trajetória e experiência enquanto empreendedora. “Nunca pensamos que precisaria ser uma mulher, pensamos então que não podia ser outro homem de 34 anos”, garante Consentino.

A candidata a vice é dona de um tradicional restaurante na Capital que sofreu com as consequências das enchentes de maio deste ano, assim como a crise instaurada pela pandemia de Covid-19 em 2020. Concorreu a vereadora pelo Novo em 2016 e é vice-presidente do Sindha (Sindicato de Hospedagem e Alimentação de POA e Região).

No PSol, que integra a coligação com o PT e forma a única chapa integralmente feminina, o presidente municipal do partido, vereador Roberto Robaina, afirma que a escolha de Tamyres se deu sob um conjunto de fatores, incluindo gênero e raça.

Isso porque o partido busca, historicamente, promover maior representatividade entre suas candidaturas. Por isso, uma mulher, negra, com histórico de militância, oriunda do movimento popular e trabalhadora, se encaixa naquilo almejado.

Assim, a decisão – que foi exclusiva do PSol – de indicar Tamyres para a composição da chapa, segundo Robaina, não teve relação com a obrigatoriedade de destinação dos recursos. Argumento corroborado, de acordo com o vereador, quando observado o histórico de valorização das mulheres na sigla, inclusive pela sua influência na formação do partido, citando a deputada estadual Luciana Genro.

Apesar disso, em 2022, quando o partido teve a primeira oportunidade de indicar um nome para compor a chapa encabeçada pelo PT com Edegar Pretto para disputar o governo do Estado, o escolhido foi um homem, o vereador Pedro Ruas.

À época, o fato das principais lideranças femininas do partido (Luciana e Fernanda Melchionna) estarem concorrendo, a deputada estadual e federal, respectivamente, pesou, explicou Robaina. Por isso, a preferência por outro nome forte.

Em Porto Alegre, candidaturas são atravessadas pela polarização

Outro elemento também pode ser adicionado na equação de Porto Alegre para explicar o aumento nas candidaturas femininas, afirma a doutora em Ciência Política e professora da Ufrgs, Cibele Cheron, a polarização. Ela explica: com o acirramento entre os dois polos políticos, a direita vem adotando práticas e bandeiras tradicionalmente defendidas pela esquerda, a exemplo da defesa de maior participação feminina na política.

“Em um ambiente bastante radicalizado entre esquerda e direita se opondo ferozmente, se existe mulher na esquerda, a direita vai colocar mulher para competir com mulher. ‘Se eles tem Janja, a gente tem Michele (Bolsonaro)’”, exemplificou.

Cibele complementa que, nesses casos, a estratégia é sempre ressaltar ao máximo as diferenças, exaltando as virtudes de uma explorando possíveis defeitos da outra, tentando demonstrar como ambas são diferentes.

Por isso, ainda que em Porto Alegre, Rosário e Melo venham adotando em público um discurso de “não queremos polarização”, na prática, ambos estão aliados às principais lideranças dessa polarização (Lula, de um lado, e Bolsonaro, do outro) e performam essa divisão na disputa pelo Paço Municipal.

“Mesmo que a Maria do Rosário tivesse como vice um homem na chapa, o fato de ela ser uma mulher já seria um impulso suficiente para que ele (Melo) buscasse uma mulher para a composição da chapa”, afirmou.

Ainda há outro fator, esse mais subjetivo – assim como as articulações partidárias – do que prático, que pode explicar a maior incidência de mulheres na majoritária. Teresa cita pesquisas que indicam que, em momentos de crise ou turbulência, as candidaturas femininas aumentam.

Ela explica que isso ocorre porque ainda há a utilização simbólica das mulheres como mais honestas ou “puras”. Assim, em uma Porto Alegre que passou por uma enchente histórica que arrastou a cidade, acabou com bairros e deixou marcas em toda população, a escolha de uma mulher para compor uma chapa majoritária também pode ser entendida sob esse aspecto.

Na disputa pela Câmara, número de mulheres não passa da cota

A prova de que esse movimento de inclusão feminina na política é pouco espontâneo está nas candidaturas proporcionais, cujo percentual mal ultrapassou a casa dos 30% previsto em cota. Em todo o RS, elas representam 36,28% dos candidatos este ano. Em 2020, eram 36,09%. Em Porto Alegre, ainda que o percentual seja maior, também não é animador. Entre os postulantes, o público feminino é de 34,18%. Elas foram 32,18% em 2020.

“Em função de ainda não ter uma aplicação de punições efetivas para o descumprimento das cotas, os partidos não estão sendo suficientemente incentivados a superar as cotas. Então, na proporcional, a gente está vendo o mínimo sendo feito e não existe um legítimo esforço, um esforço real, para que as candidaturas de mulheres sejam realmente viabilizadas. Enquanto a gente não tiver incentivos ou mecanismos mais coercitivos um pouco mais fortes, a sociedade caminha com lentidão no sentido dessas mudanças de mentalidade”, lamenta a pesquisadora.

Embora o movimento de inclusão feminina em chapas ou espaços de poder não seja algo espontâneo dentro do mundo político, os sinais de que as mulheres – em todos os espectros políticos – já não aceitam mais ficar de “fora do campo” também é um elemento a ser levado em consideração, não só na Capital e no RS, mas em todo país. “O que não significa, exatamente, que você (a mulher, caso eleita) vai adotar uma defesa de interesses ou de direitos das mulheres”, relembra Cibele.

Candidaturas femininas em números:

  • Porto Alegre

Candidatas a prefeita: 3 (37,50% do total de oito)
Candidatas a vice: 4 (50% do total de oito)
Candidatas a vereadora: 175 (34,18% do total de 512)

  • Rio Grande do Sul

Candidatas a prefeita: 127 (10,50% do total de 1.210)
Candidatas a vice: 258 (21,25 % do total 1.214)
Candidatas a vereadora: 9.539 (36,27 % do total 26.300)

  • Brasil

Candidatas a prefeita: 2.315 (14,99% do total 15.439)
Candidatas a vice: 3.591 (23,11% do total 15.595)
Candidatas a vereadora: 149.472 (35,07% do total 426.228).

 

Fontes: Correio do Povo.

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