Portos clandestinos e rotas de contrabandistas para trazer soja argentina ao RS pelo rio Uruguai

O Grupo de Investigação da RBS (GDI) flagrou a ação de pessoas transportando sacas do grão plantado no país vizinho para serem vendidas pelo dobro do preço no Brasil.

A Brigada Militar e as polícias Civil e Federal mapearam mais de 50 portos clandestinos improvisados pelos contrabandistas ao longo de três municípios da região. Mas esses atracadouros improvisados na lama podem ser muito mais que 50. O GDI esteve em 10 portos concentrados num pequeno trecho de dois quilômetros nas proximidades de Porto Soberbo, distrito de Tiradentes do Sul. Algumas propriedades chegam a ter duas saídas clandestinas para o rio.

Inquéritos na Polícia Federal (PF) revelam que muitas vezes os mesmos barcos usados para transportar soja carregam junto agrotóxicos proibidos no Brasil.

O crescimento do contrabando pode ser constatado a partir do aumento nas apreensões feitas pelas autoridades. A Receita Federal contabiliza 444 toneladas de soja e milho contrabandeadas apreendidas no primeiro semestre de 2023, em 82 quilômetros de fronteira que separam as três cidades costeiras do noroeste do RS da Argentina. O equivalente a 10 carretas carregadas de grãos.

Muitas dessas apreensões foram feitas pela Brigada Militar e Polícia Civil, junto à Receita Federal, no âmbito da Operação Agro-Hórus (que mira todo tipo de contrabando). Foram apreendidas também barcaças de diversos tamanhos.

A PF de Santo Ângelo, que atua na fronteira noroeste, contabiliza 45 ações nos últimos dois anos, com 89 indiciados (na maioria, presos). Dois flagrantes, em 2022, foram gigantes: um com 27 presos e outro, com 16 pessoas presas.

Ao introduzir de forma ilegal o produto pela fronteira brasileira, o produtor escapa do pagamento de impostos de exportação que são cobrados na Argentina. O dono de uma carreta hermana precisa desembolsar 1 milhão de pesos em imposto — o equivalente a R$ 8.695 — em Misiones para chegar à fronteira com carga de soja.

Caso o argentino opte pelo crime de contrabando, consegue R$ 60 por saca de soja. Caso o produtor argentino resolva pagar impostos em seu país e exportar legalmente, restará a ele R$ 32,45 por saca do grão.

O produtor de grãos foge do controle fiscal e os estivadores garantem emprego, algo escasso na Argentina. Cada um deles ganha entre 3,5 mil pesos (R$ 30) e 5 mil pesos (R$ 43) para ajudar a descarregar uma carreta de 42 toneladas.

“É um serviço com jeito de trabalho escravo. Esses estivadores atuam sem carteira assinada e sem garantia de assistência caso sejam presos. Mas, mesmo assim, acreditam que compensa. Ganham menos de R$ 30 se forem trabalhar nas lavouras de chá, erva-mate ou citronela, produtos dessa parte da Argentina”, analisa o delegado da Polícia Civil, Marion Volino, que atua em Três Passos, e é um dos responsáveis por investigações sobre crimes nessa região de fronteira.

Do lado brasileiro, os receptadores também lucram com o crime. Podem comprar o grão contrabandeado a um preço um pouco menor do que o praticado no Brasil, a R$ 60, e revender a cerealistas por R$ 140. Para disfarçar a origem da operação, usam talões de notas “calçadas” (frias). O resultado é que a Receita Federal tem encontrado pequenas propriedades, até 15 hectares, que declaram notas de produção de soja totalmente incompatíveis com o tamanho de suas áreas rurais.

 

Fonte: GZH.

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